Home Office: Estamos indo de volta para casa

Haverá algo de verdadeiramente proveitoso nas difíceis circunstâncias que estamos vivendo de volta para casa na pandemia?

Tendo a acreditar que sim. Na possibilidade nada remota de podermos sempre extrair, se não no momento, mas ao longo do tempo, algo de bom, de aproveitável, em quaisquer que sejam ou tenham sido as situações enfrentadas.

Todos os que como eu já se submeteram a uma cirurgia sabem os desconfortos físicos e emocionais antes, durante e depois. Como aquela coisa desagradável, como sempre lembra minha esposa, você deitado na maca, sendo conduzido pelos corredores, olhando para as luzes no teto em direção ao centro cirúrgico. Argh…! Só de lembrar me dá voltas no estômago.

Mas se é tão ruim, tão desconfortável, por que enfrentamos algo assim? Simples. Todos sabemos: estamos atrás da restauração do que não está bem ou da cura do que está todo ruim.

Há de haver, portanto, algo de bom naquilo que é mal, ou parece ser só mal.

E então chegamos à pandemia, às restrições de locomoção, de acesso, de ajuntamento e pum… vamos todo mundo (não, todo mundo não, mas muitos, muitos de nós) para o home office. Junção simples de dois termos simples, o lar e o escritório, o trabalho de volta para casa.

E assim, curiosamente, retornamos 200 anos do relógio da História e agora, de novo, pai e mãe, filho e bebê, papagaio e Luiz Carlos (o salsicha da família), estarão agora todos juntos, re-unidos, jun-tados, co-lados, lado a lado, todos os dias, todos os momentos do dia, o dia inteiro, o mês inteiro, um ano inteiro. Oba!

Oba?!… Como assim? Minha vida virou um inferno. É papagaio que late – sim, ele imita o Luiz Carlos e o Faustão, ô loko meo -, é cachorro que mia – não tem explicação é apenas um fato -, o bebê que morde o irmão, esposa que chora e… caramba, esqueci a aula online do Julinho.

Pois é meu irmão e minha irmana, mas será que foi só isto?

Será, apenas será, que depois de 10 anos de casados – caramba, o Julinho vai fazer 8 anos, como cresceu este moleque – só quando o office voltou para o home, só quando vocês voltaram a trabalhar juntos – ainda que em empresas totalmente diferentes – que finalmente vocês foram, de verdade, morar juntos?

Antes eram uns 5 oi-bem-tchau-bem por semana.

Vocês se viam, quase sempre meio embaçados, ainda sonados no café da manhã e iam cada um pro seu lado. Hora e meia de trânsito para ir, outro tanto para voltar, e exaustos se esbarravam no final do dia. Papo corrido. Atenção dividida entre bebê, Julinho, tv, papagaio e Luiz Carlos – tá gordo, precisamos levar ele no veterinário no sábado, … se der… tanta coisa para fazer neste sábado.

E hoje?

Hoje é, oi bem, oi bem, oi bem, oi bem, oi bem…. como um eco. Oiiiiii bemm oooooiiii bemmm. 6 dias, 7 dias, 37 dias… um ano. Oi bem.

E de repente, todo mundo começou a trocar os móveis. Descobrimos a casa onde vivemos. Descobrimos também aqueles outros todos que vivem na nossa casa.

Pai começou a ouvir choro de bebê, todo dia, o dia inteiro. Sim, aquele mesmo que mãe ouve 700 vezes por dia, todos os dias. Mãe começou a entender de biologia para ajudar o Julinho. Pai começou a entender de biologia para poder ajudar a mamãe a ajudar o Julinho. Julinho que já entendia tudo de computador, precisou aprender a usar o Zoom para poder ajudar o papai e a mamãe a fazer conferencecól.

E de repente, não mais de que de repente, quando o office foi para o home, a gente começou a perceber que home não é house, house é casa, home é lar. House is made of bricks home is made of love and love is made of relationships. E a gente só se relaciona estando perto, e sim, essa coisa toda é séria, é mortal, mas ela nos ajuntou. De volta para casa.

Separou do chefe, do trânsito, do coleguinha, do parceiro de breja, mas nos ajuntou dentro de casa. E tivemos, e ainda estamos tendo a chance de aprender mais sobre quem são cada um dos habitantes de lugar chamado lar. E de aprendermos com eles quem verdadeiramente somos.

Depois de 200 anos de Revolução Industrial que tirou os pais de dentro de casa e os levou para fora, para longe, para a fábrica. A Coisa, nos trouxe de volta para dentro.

E isto tem um imenso potencial de ser verdadeiramente ótimo.

Eduardo Cupaiolo
Eduardo Cupaiolo
Especialista em desenvolvimento humano e organizacional. Diretor e consultor da PeopleSide.

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