Competências Humanas, Liderança e Tecnologia – Relatos de Brumadinho

Relatos sobre as operações de resgate, busca e salvamento em Brumadinho – um exemplo da união entre a potencialidade humana e a tecnologia.

Competências Humanas

Major Karla Lessa Alvarenga Leal

Major do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais

Participou das operações de resgate, busca e salvamento de vítimas do rompimento da barragem em Brumadinho. Pilotou o helicóptero e manteve-o estável por mais de 7 minutos, a poucos centímetros do chão, no surpreendente resgate da Thalyta de Souza, uma das vítimas da tragédia.

Atuando diretamente no resgate de vitimas da tragédia em Brumadinho, a Major Karla Lessa explicou com detalhes como foi, e continua sendo, as operações em Brumadinho e como as Competências Humanas foram imprescindíveis para o sucesso das missões.

Nos contou que no dia 25 de janeiro de 2019 estava de prontidão para atendimento no corpo de bombeiros, e às 12:36, logo após o almoço, chegou um chamado de rompimento de barragem. Então, se deslocou em direção à sala de operações e imediatamente sua equipe foi mobilizada.

Diante da tragédia, tempo e resposta passaram a ser algo que poderiam fazer muita diferença para salvar pessoas. Sendo a primeira equipe a chegar no local, inicialmente analisaram o estado da barragem para dimensionar o tamanho da tragédia e trançaram um plano estratégico de resgate. Karla teve sua equipe dividida em duas para otimizar os recursos.

Visando melhorar o início das operações, também adotaram uma metodologia de resgate e uma forma de atendimento padrão, o método Start (onde as vítimas são classificadas por nível de prioridade e recebem cores: preto, vermelho, amarelo e verde, de acordo com a gravidade dos ferimentos e risco de morte). O médico, enfermeiro e copiloto foram posicionados para receber as vitimas resgatadas pelo helicóptero.

A partir desse momento, Karla disse cada integrante da equipe possuía sua própria missão, o que tornou mais claro os objetivos de cada um. Porém, diante das mais diversas missões, também foi necessário definir prioridades.

  1. Resgatar vítimas vivas
  2. Comunicar aos diversos órgãos e agentes – Fazer uma comunicação eficiente, ágil, objetiva e rápida, para que cada um se articulasse de acordo com a sua função
  3. Gerenciar os riscos como segurança de voo, obstáculos e capacitação da equipe
  4. Controlar as emoções

Karla aproveitou para destacar alguns pontos relevantes que impactaram no sucesso da missão:

  • A gestão operacional foi importante para otimizar os recursos, analisar os equipamentos e melhorar a utilização das aeronaves.
  • Manter o controle da segurança e conservação da aeronave ajudaram a garantir a disponibilidade dos equipamentos pois havia um número limitado de recursos.
  • Diariamente eram realizados briefings (reuniões antes das missões para definir quais estratégias seriam adotadas) e debriefings (para analisar os resultados do dia).

A evolução da operação

“O dia de amanhã precisa ser melhor do que o dia de hoje”

Inicialmente os registros eram feitos manualmente em papéis, mas em pouco tempo passaram a ser feitos em computadores e permitiram a informatização da operação.

Os atendimentos começaram sendo feitos em um campo de futebol adaptado, mas posteriormente foi montado um posto de atendimento médico mais estruturado.

O local de pouso e decolagem das aeronaves também precisavam ser otimizados. Para isso, foi estruturado um layout que facilitava a operação das missões em um posto avançado.

Em relação ao tráfego aéreo, estava desorganizado nos primeiros dias, as aeronaves se aproximavam em rotas conflitantes e corriam risco de choque. Isso foi organizado, definindo um caminho padrão a ser seguido.

Tudo isso permitiu a realização uma operação com índice zero de acidentes graves, motivo de muito orgulho diante de tantos riscos que estavam submetidos.


Liderança

Tenente-Coronel Alexandre Gomes Rodrigues

Comandante do Batalhão de Operações Aéreas do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais

Exerceu papel de liderança na coordenação das operações de resgate, busca e salvamento em Brumadinho. Otimizou os recursos humanos, maquinários e logísticos disponíveis para o sucesso da missão.

O Batalhão de Operações Aéreas coordenou a maior operação de busca e salvamento ocorrida no País. Além de Brumadinho, outras comunidades também foram pontualmente atingidas, como a Parque da Cachoeira e Córrego do Feijão, onde foi montado o Posto de Comando. Essas comunidades ficavam muito próximas à barragem e foram atingidas logo no começo do rompimento.

Alexandre conta que no momento da tragédia, havia apenas um helicóptero disponível e era impossível se locomover de outra maneira. Então, desde o início o já começou a mobilização de outros recursos. Inicialmente solicitou apoio à Polícia Militar, Polícia Civil e ao Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro, que foi acionado no mesmo dia da tragédia e no dia seguinte, logo pela manhã, já estava no local para participar dos trabalhos de resgate, busca e salvamento. Também iniciou o contato com empresas fornecedoras, como a Safran (responsável pelas turbinas das aeronaves), a Helibras (fabricante dos helicópteros), e a própria Vale que era dona da mina. Mais recursos humanos foram necessários, o que levou-o a buscar rapidamente por pessoas em outras cidades do interior mineiro.

A partir de então, tudo precisava ser gerenciado, desde os recursos humanos aos recursos logísticos. No segundo dia foi montado um Posto de Comando no local, usado como base para organização das missões e estratégias.

Diariamente ocorria uma reunião para traçar novas estratégias. Entre os integrantes da operação, haviam pessoas de diversas localidades, desde o interior à capital mineira, com formações e especializações diferentes. Pode-se pensar que pessoas com pensamentos e doutrinas tão diferentes poderiam dificultar as operações, tornando-se um ponto negativo, porém não foi. Alexandre disse que, na verdade, todas as diferenças se complementaram e vieram a ajudar a operação. Pessoas diferentes que se uniram, sem nunca antes terem se encontrado, e isso acabou sendo um ponto muito positivo.

A operação foi organizada de modo a otimizar as atividades do dia a dia, separando todos os setores operacionais para que a informação fluísse entre as operações terrestres e aéreas. As demandas saiam das operações terrestres, passando de forma coordenada para as operações aéreas, que emitiam as ordens de serviço.

Nos primeiros momentos da operação, as aeronaves sobrevoavam o local e agiam desorganizadamente. Rapidamente isso foi corrigido, de forma que todos trabalhassem de maneira coordenada, cumprindo exatamente a ordem de serviço que foi destinada.

Alexandre citou que a partir do terceiro dia, haviam aeronaves do Rio de Janeiro, de São Paulo, do Paraná, do Ibama, da Polícia Federal, da Força Nacional, da Polícia Rodoviária Federal, da Polícia Militar de Minas Gerais e da Polícia Civil de Minas Gerais, ou seja, várias pessoas dentro de um pequeno espaço, mas que por seguirem o planejamento, conseguiram o sucesso na missão das operações, aprendendo a cada dia com a experiência alheia.

Além dos helicópteros, outros recursos tecnológicos também foram fundamentais na operação, como drones e magnetômetros (aparelho que identifica corpos metálicos até 25 metros de profundidade).

Apesar da dificuldade aumentar a cada dia, suas forças continuam lá.

As motivações

Muitas motivações mantiveram a equipe trabalhando engajada e com esperanças. Algumas delas foram:

  • As centenas cartas recebidas de crianças e familiares que agradeciam pelo trabalho prestado e pediam para que as buscas continuassem.
  • A chuva de pétalas de rosas feita pelo Corpo de Bombeiros em homenagem as vítimas, realizado exatamente uma semana após a tragédia, no mesmo momento do rompimento
  • As mensagens motivacionais que eram transmitidas diariamente pelo Controle de Tráfego Aéreo, desejando força, um bom trabalho e que entendiam da dificuldade da operação.
  • A busca pelas pessoas que continuam desaparecidas.

Tecnologia

François Haas

Presidente da Safran Helicopter Engines Brasil e América Latina

O período pós-tragédia em Brumadinho foi um momento que mostrou como a tecnologia pode ajudar a sociedade.

A Safran, como fabricante de turbinas para helicópteros, ajudou a resgatar e salvar vidas através do seu produto. Segundo François, para o piloto, enquanto em voo, a turbina do helicóptero é como o coração da aeronave e, por conta disso, não pode parar de funcionar, não pode sofrer uma parada cardíaca. Além disso, quando o helicóptero precisa decolar, a turbina deve estar disponível.

François enfatizou que a tecnologia deve estar ligada à missão do cliente final e as pessoas precisam entender isso. Algumas empresas se perdem, criando tecnologia por tecnologia, mas a missão através do produto é na verdade salvar vidas, proteger o meio-ambiente e proteger as pessoas. Disse que podemos comparar a tecnologia da Safran com um corpo humano, onde a turbina é o coração e o mecânicos são quem vão cuidar da saúde durante toda a sua vida.

A situação em Brumadinho foi uma situação extrema que exigiu o máximo da Safran. Cerca de uma hora após a tragédia, os helicópteros precisam estar sobrevoando a área. No pico da operação, houveram mais de 20 helicópteros, fazendo mais de 70 missões por dia, com uma disponibilidade de 24h por dia/ 7 dias por semana.

E para fazer isso acontecer, sempre existiram as seguintes prioridades:

  1. Segurança: quando o piloto está no comando, ele precisa ter a certeza que a 1 metro do chão a aeronave terá a capacidade e potência necessária para voar e fazer o resgate.
  2. Disponibilidade: o helicóptero, por ser uma máquina muito cara, não pode ficar no chão. O cliente tem que confiar no atendimento e a empresa precisa entregar isso com perfeição.
  3. Simplicidade: a tecnologia precisa tornar a vida do cliente mais simples. O piloto deve focar apenas na missão de resgate, não se preocupando com a turbina. A turbina deve funcionar sozinha.

De maneira geral, a tecnologia tem que ajudar a humanizar a vida de todos nós. É para isso que trabalhamos tanto.

François faz uma analogia à famosa culinária francesa, e diz que o segredo dos pratos é simples:

  1. Bons produtos
  2. Boas receitas
  3. Bons cozinheiros
  4. Paixão pela cozinha

Com a tecnologia não pode ser diferente. Seguindo a analogia de François:

  1. Os produtos são a tecnologia, a fábrica e as ferramentas.
  2. As receitas são os processos e métodos de trabalho, que devem ser muito bem organizados.
  3. Os cozinheiros são os colaboradores, que devem ser capacitados, engajados, disciplinados na execução das tarefas e com uma liderança forte.
  4. A paixão é o foco no cliente, na perfeição do atendimento e na entrega do produto.

Finaliza dizendo que somente quando conseguimos juntar esses 4 pontos é possível fazer a ligação entre a tecnologia e a satisfação do cliente.

Redação
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